Na semana passada, iniciámos a nossa viagem em busca do santo graal da indústria de gestão de ativos: a obtenção de um retorno acima do mercado. Nesta semana, antes de chegarmos ao nosso destino, vamos fazer uma paragem obrigatória numa ilha a meio do caminho: a ilha da fundamentação teórica. Esta ilha não detém o cobiçado tesouro, mas sim o mapa que marca o “X”.
Nesta ilha imaginária, somos cumprimentados por três amigos: Diversificação, Gestão de Risco, Avaliações. À vez e ordenadamente, cada um destes amigos procura juntar as peças do puzzle:
O nosso amigo Diversificação inicia:
Costuma-se dizer que a diversificação é o único “almoço grátis” disponível no mundo dos investimentos. No curto prazo, nós olhamos para os mercados e tendemos a focar na ação, fundo ou classe de ativos que está a ter o melhor desempenho. À data em que escrevo, Bitcoin (+55% desde janeiro de 2024), ações tecnológicas americanas (+25% desde janeiro de 2024) e ouro (+33% desde janeiro de 2024) concentram em si todas as luzes da ribalta. É então compreensível, embora errado, que o comum dos mortais julgue ser uma excelente ideia investir numa “carteira diversificada” composta por apenas estes três. Fazê-lo seria tão boa ideia quanto conduzir um carro usando apenas os espelhos retrovisores. A 100 km/h. Eu gosto de resumir a arte (pois está longe de ser uma ciência exata) de investir como: comprar o futuro aos preços que estão cotados hoje. Já voltamos a este ponto.
O caro leitor não tem que acreditar em mim, mas pode certamente depositar alguma confiança no estudo “Geographic Diversification Can Be a Lifesaver”, publicado em fevereiro de 2019 pela Bridgewater Associates. Neste estudo, a Bridgewater Associates compara a performance, agrupada em décadas, de investir em mercados acionistas de 16 países individuais desde 1900 vs investir em proporções iguais em cada um destes países. Exemplo: se temos dados disponíveis para 10 países, cada país terá um peso de 10% na carteira global. Se temos dados disponíveis para 16 países, cada país representará 6,25% da carteira global. Poupando algum trabalho ao caro leitor, a Bridgewater Associates conclui que uma carteira de ações geograficamente diversificada 1) evita o pior cenário possível de perda total, 2) os países com retorno acima da média numa década tendem a ter retornos abaixo da média na década seguinte e 3) a carteira atinge um retorno equiparável aos melhores países mas com menor volatilidade. A verdadeira definição de um almoço grátis!
O nosso amigo Gestão de Risco complementa:
Um dos grandes contrassensos da indústria financeira é que, apesar de “risco” a permear constantemente, a definição da indústria não poderia ser mais díspar da definição do investidor comum. Quando falo com os meus investidores e lhes pergunto o que significa “risco” para eles, as respostas tendem a ser bastante homogéneas: perda inaceitável do capital investido, não conseguir obter o retorno que precisam para cumprir os seus objetivos, trajetória decrescente do capital no médio prazo, etc. Pois bem, a definição da indústria é bastante diferente e resume-se à definição de volatilidade, que é uma medida de dispersão dos ganhos e das perdas. Segundo esta definição, uma empresa como a Nvidia, que está a subir cerca de 180% desde o início do ano, tem muito mais risco que a Alphabet (empresa-mãe da Google e do YouTube), que está a subir “apenas” 20%. Alguns dos leitores, embora se descrevam como investidores conservadores, certamente prefeririam estar investidos na primeira e não na última. Em suma, um indivíduo com fato escuro às riscas, que trabalha na City, agrega na mesma definição “risco de ganhos” e “risco de perdas”, enquanto que o investidor comum apenas perde noites de sono com o “risco perdas”.
Feita esta introdução, gostava de partilhar como eu penso sobre este tema:
No médio prazo, o preço de uma carteira diversificada de ativos tende a reverter/corrigir para uma “média natural”, a qual pode ser calculada dinamicamente com recurso a risk premiums e outras metodologias que abordaremos certamente no futuro. É também intrínseco à natureza humana extrapolar que as condições vigentes, ótimas ou péssimas, irão perdurar no futuro. Exemplo: quando o preço de um ativo está a subir, nós atribuímos uma probabilidade > 50% de que ele continue a subir, e vice-versa para o preço de um ativo que está em queda livre. Em vez de pensarmos em comprar, atribuímos uma probabilidade > 50% de que vai cair ainda mais. Este enviesamento cognitivo tem tudo a ver com psicologia e nada a ver com finanças.
Juntando as peças: nós tendemos a comprar/segurar ativos que têm vindo a subir porque a sua performance no passado foi bastante positiva e, como tal, é difícil de replicar no futuro, expondo-nos assim a eventuais desilusões futuras (risco de perdas). Tendemos a vender ativos que têm vindo a descer porque a sua performance no passado foi aquém das expetativas e, como tal, é difícil de replicar no futuro, evitando assim que estejamos expostos a surpresas positivas no futuro (risco de ganhos).
No artigo da próxima semana, terminamos com as observações do nosso amigo Avaliações, o que nos aproximará do destino final da nossa viagem.
João Feliciano Martins
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